Mars To Travel
Tarrafal, Ilha de Santiago, Cabo Verde
Visitamos 3 ilhas de Cabo Verde, durante duas semanas em Novembro de 2019. Passamos pela Ilha de Santiago, Boa Vista e a última paragem foi a Ilha do Sal.
Neste post, vou descrever o que fizemos no Tarrafal.
A viagem até ao Tarrafal serviu para ter uma maior noção da ilha de Santiago – já que basicamente a atravessamos para lá chegar.
O percurso faz-se pela única estrada que existe, atravessando, como já referi, a Serra da Malagueta. E é este o principal destaque para a viagem, uma paisagem linda que nos faz querer voltar a fazer aquele percurso pernoitando nalguma das vilas que cruzaram o nosso caminho, com o fim de conhecer melhor esta zona.
No percurso, além de testemunharmos serra, é-nos possível também ver um pouco das vilas e as gentes que se cruzam com este trajecto.
Desde crianças no regresso da escola, percorrendo largos quilómetros para voltar a casa, cheios de estilo, a brincar e a dançar, a ouvir música ou simplesmente na conversa com o amigo do lado, dando uma lição de simplicidade a nós que os observamos
Mães que foram buscar as suas crias à escola, mães que se despedem dos filhos antes de entrarem no Hiace para iir trabalhar, infindáveis bancas de vendedores de frescos na borda da estrada, mulheres que carregam grandes garrafões de água ou produtos alimentares, por quilómetros até chegar a casa, seja para venda ou consumos da própria família.
Muitas deles vão cedo até ao Tarrafal comprar peixe, para depois os venderem nas vilas, fazendo diariamente uma quantidade insana de quilômetros com a mercadoria à cabeça. .
Já na volta, testemunhamos as infindáveis bancas, agora vazias, missas e comícios políticos a céu aberto, concertos de jazz, e música, muita música em cada cantinho deste trajecto.
Com o tempo reduzido na ilha ir ao Tarrafal retiraria a possibilidade de conhecer a cidade velha, ainda assim não nos arrependemos nem por um segundo.
Se a viagem foi divertida, chegar ao Tarrafal, e vislumbrar aquela praia azul cercada de um montanhoso verde que a envolve, banhada com areal imaculado, foi o melhor que nos poderia ter acontecido.
Vila pequena, tipicamente pescatória, super amorosa e cheia de vida e cor, com pessoas ainda mais simpáticas e afáveis, e com um peixe maravilhoso!
O areal da praia tem imensos barcos coloridos ‘’estacionados’’ que logo denunciam a localização do mercado do peixe, onde as mulheres dos pescadores vendem o produto obtido no mar naquele dia.
Apesar da vontade de almoçar, não resistimos ao primeiro mergulho no mar de Cabo Verde, a água morna e limpa, de onde fica difícil sair de tão boa que é!
Para além da praia, visitamos a vila com as suas casas típicas e o mercado, tentando absorver o máximo da vida local.
Depois de uma maratona de mergulhos, fomos até ao Museu da Resistência, um antigo campo de trabalhos forçados, construído pelo Estado Novo, muitas vezes conhecido por ‘’campo da morte lenta’’, para onde foram enviados alguns presos políticos portugueses e das antigas colónias portuguesas.
O Museu da Resistência fica uns largos metros afastado do centro do Tarrafal, na ida apanhamos uma boleia (por uns 25 escudos cada um) numas carrinhas de caixa aberta, uma espécie de táxi utilizado pelos locais.
Antes de entrarmos no Campo, existem uns edifícios do lado direito, que anteriormente seriam as residências dos oficiais que trabalhavam no Campo do Tarrafal, e que são hoje morada de algumas famílias.
Mal lá chegámos algumas crianças vieram ter conosco pedindo dinheiro, foi a única vez que isso aconteceu em todas as férias em Cabo Verde. Tentamos satisfazer os pedidos com marcadores, livros e o resto da garrafa de água que tínhamos connosco.
Na entrada do campo encontramos o Zezinho, que trabalha no Museu da Resistência há 27 anos, e ali vive. Contou que tem 3 filhos, dois machos e uma fêmea, segundo o próprio.
Os olhos dele encheram-se de lágrimas quando contou que os filhos partiram para o Senegal e França em busca de trabalho, assim como quando falou um pouco sobre o seu local de trabalho, o Campo de Morte lenta construído por portugueses.
Após uma conversa com o porteiro do campo, que, para além de nos ter resumido a história da sua família, nos garantiu que recebiam muitas turistas de diferentes países, entramos no campo onde eramos os únicos visitantes.
O local ensina algumas das crueldades cometidas pelo regime português aos seus adversários políticos, numa primeira fase mais cruel do campo, e aos combatentes pela liberdade das colônias numa segunda fase.
Há um esforço interessante de partilhar o conhecimento sobre o que lá se passou através de placas informativas no espaço degradado do campo.
Podemos ver todos os edifícios do Campo, e perceber um pouco melhor quem foram os presos políticos que ali morreram, foi muito interessante fazer aquela paragem, aconselho a fazer o mesmo.
Regressamos à Praia no colectivo, desta vez tivemos a sorte de ser dos últimos ocupantes, e não esperamos muito.